Carnap: Ontologia e Meta-ontologia

sera

Let us be cautious in making assertions and critical in examining them, but tolerant in permitting linguistic forms. 

Rudolf Carnap

Neste breve artigo pretendo discutir a dimensão ontológica e meta-ontológica presente nas obras de Rudolf Carnap posteriores ao célebre Der logische Aufbau der Welt. Nossa discussão, portanto, investigará o conceito de quadro de referência linguístico [linguistic framework], a relação entre questões externas/internas ao quadro de referência e a relação entre diferentes quadros. De início, é necessário apresentar de que forma iremos entender “ontologia”, tendo em vista as inúmeras confusões pelas quais o termo passou na história da filosofia. Para este fim, introduziremos o termo à luz das considerações feitas por Peter Wolfendale acerca deste em Object Oriented Philosophy: The Noumenon’s New Clothes, tentando com isso localizar o pensamento ontológico de Carnap no interior da divisão entre metafísica geral e metafísica especial; levando em conta também a rejeição do filósofo à metafísica em sentido forte e sua relação com a análise conceitual enquanto dimensão meta-ontológica. 

 

  1. Introdução: Metafísica Geral e Metafísica Especial 

Peter Wolfendale empreende, em Object Oriented Philosophy, uma crítica à ontologia orientada a objetos (OOO), representada pelo filósofo Graham Harman. No entanto, a importância da obra citada para nosso assunto não se encontra nessa crítica, mas em dois capítulos específicos onde o autor traça o percurso tomado pelo conceito de ontologia ao longo do século XX em ambas as tradições analítica e continental. Seria correto afirmar que a ontologia lida com o ser, com tudo que, de alguma maneira, é. Enquanto um discurso sobre o ser, não está dada a forma pela qual as coisas vêm a ser e nem qual o modo próprio de ser de determinado ente (aquilo que é). Essa abertura inerente ao conceito de ontologia é o que complexifica nosso objeto de estudo, uma vez que, segundo Wolfendale, a maneira com que filósofos da tradição analítica e continental o tratam se difere significativamente. Para dar maior clareza a essa diferença, o autor se serve da distinção escolástica entre metaphysica generalis e metaphysica specialis, que, vale dizer, é mais antiga que o próprio conceito de ontologia, que aparece no século XVII popularizado por Christian Wolff. 

Usar a palavra “ontologia” em companhia filosófica misturada pode se mostrar desafiador. A origem do termo está na divisão escolástica da metafísica em suas várias sub-disciplinas, nas quais a ontologia – como a ciência dos seres enquanto seres – compreende a metaphysica generalis, ou a tentativa de articular a estrutura dos seres como tal, como oposta à cosmologia, psicologia e teologia – as ciências dos seres naturais, racionais e mais elevados – que formam a divisão tripartite da metaphysica specialis, ou a tentativa de circunscrever a estrutura dos seres como uma totalidade. (WOLFENDALE, 2014, p.)

Para Wolfendale, portanto, a maior parte dos filósofos chamados continentais trata a ontologia como discurso do ser enquanto ser (metaphysica generalis), cuja articulação demanda uma investigação pelo fundamento de tudo aquilo que é, algo sem o qual nada vem a ser ou a existir. É possível pensar em Heidegger como paradigma dessa forma de fazer ontologia, quando ao início de Ser e Tempo ele anuncia que, desde Aristóteles, a história da metafísica é marcada pelo esquecimento do ser, onde aquilo que se tomou como ser era na verdade ente, algo que já carrega consigo o fato de ser. A ontologia se aproxima aqui do conceito aristotélico de filosofia primeira, se ocupando da busca por uma arkhé, a origem última comum a todos os entes.

Por outro lado, a tradição analítica tende a fazer ontologia de maneira mais próxima àquela do conceito de metaphysica specialis, o que pode ser considerado como um discurso sobre o ser enquanto totalidade. Nessa concepção existem regiões de entes que diferem entre si em relação a seus modos de ser; por exemplo, a diferença entre o modo de ser de um número e de um animal, entre um conceito filosófico e uma formação geológica. A questão pelo significado de ser em geral, quando colocada, é posta em segundo plano É interessante pensar que as duas formas de conceber o discurso ontológico não são excludentes, e que nos exemplos citados por Wolfendale é possível encontrar problemas de metafísica geral na filosofia analítica e de metafísica especial na filosofia continental. 

Ao invés de perguntar pela essência ou fundamento de tudo aquilo que é, Quine, paradigmaticamente, em seu artigo “Sobre o que há”, pergunta pelas coisas que são: 

Algo curioso sobre o problema ontológico é sua simplicidade. Ele pode ser formulado com três monossílabos do português: “O que há?”. Ele pode ser resolvido, além disso, com uma palavra — “Tudo” —, e todos aceitarão essa resposta como verdadeira. (QUINE, 2011, p.11)

Chama atenção a suposta simplicidade com que Quine trata o problema ontológico, muito diferente da investigação heideggeriana do ser. Aqui, a ontologia é vista como um campo dividido em diferentes regiões que se estruturam e articulam de maneira própria, e onde todos os objetos e/ou entes podem ser localizados e quantificados, e mais importante e acima de tudo, formalizáveis. De fato, a quantificação figura como primordial nessa concepção de ontologia, uma vez que para Quine (especificamente, embora haja remanescentes dessa ideia na tradição analítica) “supor algo como uma entidade é, pura e simplesmente, supô-lo como o valor de uma variável” (idem, p.26). Supor uma entidade como valor de uma variável é colocá-la em uma notação formal do tipo ∃x /F(x) (existe um “x” tal que x possui a propriedade F), onde o predicado é marcado pela função matemática. A importância da formalização acompanha todo o pensamento analítico, que em sua quase totalidade preza por um rigor científico, clareza conceitual e dissolução de mal-entendidos provocados pela dubiedade da linguagem cotidiana.

 

  1. Rudolf Carnap: linguistic frameworks e metalógica

Ao contrário de Quine, Carnap hesitaria em conferir existência a “tudo” independentemente do modo de ser do que se quer falar sobre. Isso porque, mesmo que Quine admita uma tolerância mínima em relação a quais entidades tomar como existentes (a saber, todas aquelas que se mostrem indispensáveis para a consistência e coerência da teoria), o quadro de referência dessa teoria será sempre o da ciência da natureza, o que acompanha um fisicalismo que restringe toda normatividade possível à lida com objetos físicos. Isso limita o alcance das possibilidades de teorização científica, ou seja, de elaboração de um arcabouço linguístico necessário para conhecer e manipular as coisas na realidade.

O positivismo lógico se apoia na rejeição da metafísica e na adoção do princípio de verificabilidade da ciência para dar conta dos problemas relativos ao mundo e ao pensamento. Primordial para a formação deste projeto foi a leitura que os membros do Círculo realizaram do Tractatus Logico-Philosophicus de Ludwig Wittgenstein, com a qual o próprio Wittgenstein não estava de acordo, vale dizer. Segundo essa leitura, existe uma relação isomórfica entre linguagem e realidade, que é sustentada pelo princípio empírico de verificação, através do qual as proposições podem ser tomadas como verdadeiras ou falsas. Mais ainda, só têm sentido aquelas proposições que podem ser verdadeiras e podem ser falsas, ou seja, proposições empíricas ou bipolares. O princípio de verificação, no entanto, não se aplica a termos comumente utilizados na metafísica, o que faz com que elas sejam não simplesmente falsas, mas completamente desprovidas de sentido. Um exemplo célebre se encontra no artigo “Superação da metafísica pela análise lógica da linguagem” de Rudolf Carnap, onde se lê:

Em um sentido estrito, no entanto, sem-sentido caracteriza uma sequência de palavras que não constitui uma proposição em uma linguagem determinada. Ocorre que tal sequência de palavras parece ser, à primeira vista, uma proposição; nesses casos, chamamos essa sequência de pseudoproposição. Nossa tese, portanto, afirma que as supostas proposições da metafísica se revelam, pela análise lógica, como pseudoproposições. (CARNAP,  2016, p. 96)

Em seu artigo “Empirism, Semantics and Ontology”, Carnap levanta a questão de se um projeto empirista deveria incluir entidades abstratas como existentes na elaboração de teorias que o sustente. A ideia básica sustentada por esse texto é a de que só podemos falar de sentido [sinn] se pressupomos a existência de um quadro de referência linguístico [linguistic framework]. Se nos perguntamos pela existência de um dado objeto, é preciso compreender que essa pergunta se faz dentro de um enquadramento específico, um certo domínio da linguagem onde os signos são dispostos de tal e tal maneira, e que torna a pergunta possível. 

Cada quadro de referência possui um sistema de regras intrínseco, que permite e rejeita certas construções em seu interior. Isso nos leva a uma das principais questões colocadas pelo texto: a diferença entre questões internas ou externas ao quadro de referência. Por questões internas, Carnap entende toda e qualquer questão, seja acerca da existência de uma entidade ou da relação entre entidades, que já está enquadrada por um sistema normativo específico; ou seja, qualquer questão  que esteja posta em linguagem formalizável. A questão externa diz respeito à decisão ética e, em algum sentido, pré-linguística que determina qual o quadro de referência a ser utilizado para qualquer que seja o fim proposto. 

Enquanto as questões internas dizem respeito à atividade da ciência, as externas são atribuídas como papel do filósofo, e, como umas dependem das outras, filosofia e ciência têm entre si uma importante relação que possibilita que haja conhecimento de mundo.Como Carnap afirma em Empiricism, Semantics and Ontology, “a demanda por uma justificação teórica, correta no caso de asserções internas, é às vezes erroneamente aplicada à aceitação de um sistema de entidades” (CARNAP, 1956, p. 9), o que significa que a escolha pelo quadro de referência linguístico a ser tomado para incluir ou não tais e tais entidades é independente do trabalho da ciência teorética. Segundo Carnap, a escolha pelo quadro de referência, enquanto questão externa, cabe ao filósofo, que toma como critério o grau de utilidade do quadro para fins específicos dentro de uma dada comunidade linguística. 

Ser real em sentido científico significa ser um elemento do sistema; portanto esse conceito não pode ser significativamente aplicado ao sistema ele mesmo. Aqueles que levantam a questão da realidade do mundo ele mesmo como coisa talvez tenham em mente não uma questão teórica como sua formulação parece sugerir, mas uma questão prática, uma questão de decisão prática que concerne à estrutura de nossa linguagem. Temos de fazer a escolha por aceitar e usar, ou não, as formas de expressão no quadro de referência em questão. (CARNAP, 1956, p. 2)

É interessante pensar em que medida o quadro de referência de que dispomos ao tratar de certos assuntos forma, ou melhor, constrói o modo pelo qual apreendemos e articulamos os fatos da experiência, uma vez que a própria experiência é mediada pela maneira com a qual a linguagem é disposta e como a usamos. Importante notar também que a relação descrita por Carnap entre linguagem e realidade se dá num nível no qual é possível elaborar enunciados científicos com o fim de explicação de um determinado estado de coisas expresso por essa linguagem. A linguagem é vista aqui como um oceano infinito de possibilidades ilimitadas de formalização e recombinação sintática, e como tal serve à ciência enquanto mediação de um conhecimento e construção cada vez mais abrangente do mundo. Essa abrangência é conquistada através do conceito carnapiano central de metalinguagem

A dimensão ontológica na filosofia da linguagem de Carnap se confunde com a dimensão meta-ontológica, onde o comprometimento com a existência de entidades não é sempre já subsumido por um quadro de referência específico, mas admite uma tolerância em relação ao quadro dentro do qual essas entidades são inseridas como termos ligados a variáveis. Em outras palavras, a forma com a qual apreendemos e articulamos as coisas no mundo é mediada pela linguagem, que, admitindo a possibilidade de ser aprimorada e expandida enquanto instrumento, só pode ser aprimorada e expandida conforme ela se dobra sobre si mesma, ao gerar uma linguagem formalizada que inclua como elemento outra linguagem, sobrepondo camadas. A seguinte citação esclarece a atitude carnapiana que marca o chamado princípio de tolerância e seu pluralismo lógico.

Em lógica não há moral. Todos têm liberdade para construir sua própria lógica, i.e. sua própria linguagem, como desejar. Tudo o que lhe é requerido é que, se se deseja discuti-la, deve-se enunciar claramente seus métodos, e fornecer regras sintáticas ao invés de argumentos filosóficos. (CARNAP, 1937, p.52)

O processo de elaboração de metalinguagem em abrangência crescente de níveis de discurso proposto por Carnap rompe sua ligação estreita com a teoria pictórica da linguagem presente no Tractatus de Wittgenstein, uma vez que se configura como uma forma de emitir proposições com sentido sobre a forma do dizer baseada somente na sintaxe. O isomorfismo tractariano entre nomes e objetos se dissolve com a metalógica carnapiana,, uma vez que não há uma forma unívoca de representação e nem a linguagem exerce exclusivamente um papel representacional. Nesse sentido, é possível dizer que tanto o Wittgenstein das Investigações Filosóficas quanto o Carnap pós-Aufbau compartilham em certa medida uma visão da linguagem como um conjunto de ferramentas à serviço do uso humano em interação; em outras palavras, pensam a linguagem em sua dimensão pragmática, como já pressupondo sempre a inextricabilidade entre uso e normatividade. Apesar dessa convergência, no entanto, a ênfase de Carnap está muito mais em como essas ferramentas atuam formalmente para o aprimoramento da ciência, e a normatividade em questão diz respeito às regras de formação sintática que valem em tal e tal quadro de referência. O papel da filosofia estaria também em empreender uma análise conceitual dos quadros possíveis à ciência, apoiando-se na correlação entre linguagem e empiria. 

O tratamento místico dado por Wittgenstein ao indizível como nonsense não é reverberado com a mesma importância em Carnap, que pretende, pelo menos em alguma medida superar esse domínio, que identifica com a metafísica. Essa superação coincide com uma gradual autonomia da ciência e clarificação da distinção entre sentimento vital (ética, estética e religião) e teoria. O problema, para Carnap, está em tentar enquadrar teoricamente aquilo que é justamente pertinente à decisão prática, ética, humana, da própria linguagem na qual toda e qualquer questão poderá ser colocada; está em tratar como contingentes proposições cujos componentes não estão colocados coerentemente em relação uns com os outros. 

Construir metalinguagens ao dispor do que Carnap chama por metalógica é uma atividade linguístico-científica que evita o que ficou conhecido como paradoxo da teoria dos tipos, qual seja, o de pensar a possibilidade de um conjunto dos conjuntos que não contêm a si próprios como elemento. As contradições que porventura aparecem ao realizar a análise de uma linguagem de que se faz uso podem ser resolvidas em uma metalinguagem um nível acima e assim sucessivamente, num movimento que não reconhece um fim determinado. O abandono da teoria pictórica e da concepção de linguagem como meio para construção de objetos é muito bem descrito por Steve Awodey e André Carus:

As regras da sintaxe não mais são descobertas, pois elas não mais são determinadas objetivamente pelos mecanismos de representação, como Wittgenstein parece sugerir. Ao invés disso, elas são uma questão de decisão humana, convenções pelas quais nós estabelecemos a linguagem da ciência. E a possibilidade resultante de ‘engendrar’ a linguagem lógica em serviço da ciência se tornou fonte de animadoras ‘aplicações possíveis em filosofia’. (AWODEY, CARUS, 2009, p.92-3)

A metalógica de Carnap portanto vai contra a ideia de uma estrutura unívoca de representação de objetos dados no mundo, encarando-os como resultado de seu posicionamento numa estrutura sintática que dispõe de múltiplas camadas e que se organiza conforme decisões humanas e por sua conformidade com a ciência. O processo de desenvolvimento científico se instancia necessariamente num ambiente social e de interação.

Se seguirmos a leitura interacionista que Reza Negarestani realiza desse período da obra de Carnap, é possível afirmar que esse mesmo processo de recombinação sintática e revisão contínua de quadros de referência instaura um circuito de retroalimentação positiva, no qual teorização e experiência fornecem uma à outra aberturas para a ampliação das formas de apreensão e engenharia da realidade. Tudo o que esse processo necessita é de uma sintaxe consistente que seja passível de aprendizado por parte de agentes racionais que a operem em interação uns com os outros; dessa relação a dimensão semântica aparece por consequência da aderência entre organização formal do discurso e o excesso que não se reconhece enquanto substância, mas como horizonte estrutural. 

Diferentes sintaxes servem a diferentes fins em diferentes regiões, demarcadas a partir de diferentes mapeamentos. No entanto a pergunta meta-ontológica, ou seja, por qual moldura formal enxergar os modos de ser de entidades em dada região, rodeia a ciência, e ilumina o fato de que a forma com a qual as coisas se nos apresentam é mediada por uma forma de ver-como que, para Carnap, tem seu lastro na estrutura sintática da linguagem e na análise formal dos conceitos utilizados por essa linguagem. É neste ponto que a análise conceitual, ainda que formal, apresenta uma abertura para que se torne ontologia, e não somente o contrário, como afirma Frederic Nef. Através da prioridade ontológica e da artificialização da sintaxe sobre a semântica, Carnap abre caminho para formas de conhecimento que alastram as possibilidades de interação e manipulação científica de mundo, servindo-se de uma concepção de lógica como órganon (lógica instrumental, cujo funcionamento se dá independente de critérios empíricos) em detrimento de qualquer essencialismo ou fundacionalismo.

  1. Conclusão

Qual é o papel histórico da metafísica? Talvez possamos ver nela o substituto da teologia no nível do pensamento sistemático, conceitual. As fontes (supostamente) sobrenaturais do conhecimento da teologia são substituídas aqui por fontes naturais, mas (supostamente) supra-empíricas, do conhecimento. Em um olhar mais detido, reconhece-se na roupagem modificada o mesmo conteúdo do mito: descobrimos que inclusive a metafísica surge da necessidade de trazer à expressão o sentimento vital, a postura segundo a qual o homem vive, a atitude sentimental e volitiva em relação ao ambiente, aos outros homens, às tarefas às quais se dedica, aos percalços que sofre. Esse sentimento vital se manifesta, na maioria das vezes inconscientemente, em tudo que o homem faz e diz; (CARNAP, 2016, p. 113)

Embora todo o empreendimento de Carnap (e do empirismo lógico, no geral) tenha como uma de suas bases um combate ferrenho à metafísica, ele reserva a ela um lugar que salvaguarda sua importância de alguma forma. Enquanto expressão poética de um sentimento vital, a metafísica peca somente na medida em que se pretende uma teoria consistente que dê conta de aspectos do mundo: coisa que somente a relação intrínseca entre filosofia e ciência é capaz de dar conta. Não fica claro porém, qual a influência que crenças metafísicas podem exercer no que tange às respostas às questões externas. Embora não-teorizável, existe uma abertura para pensar que a metafísica parece influenciar o desenvolvimento teórico da ciência, ao figurar como aquilo para o qual uma dada comunidade a princípio não possui aparato técnico o suficiente para realizar a formalização, mas que apesar disso pesa na decisão por qual quadro de referência utilizar para interpretar os fenômenos empíricos. 

Somado ao diagnóstico da metafísica, Carnap não parece admitir de todo que sua filosofia contenha uma ontologia. Apesar disso, a articulação entre suas concepções de quadro de referência linguístico e de meta-lógica acabam por inserir seu pensamento na tradição da ontologia analítica, mas de maneira peculiar. Através de um cruzamento entre questões da metafísica geral e metafísica especial (como modalidades do discurso ontológico) representado pelo contraste e complementaridade entre questões externas e internas, Carnap acaba por delinear uma ontologia aberta com lastro científico, mas ainda assim pragmático e social, onde o modo de ser das coisas que são e aquilo que faz com que elas sejam é decidido pelo entrelaçamento entre teoria e prática, rigor científico e sentimento vital, ético e estético.

BIBLIOGRAFIA

AWODEY, S. ; CARUS, A. From Wittgenstein’s Prison to the Boundless Ocean: Carnap’s Dream of Logical Syntax in: BEANEY, M. (Ed.) Carnap’s Logical Syntax of Language. New York: Palgrave Macmillan,  2009.

CARNAP, R. The Logical Syntax of Language. London: Routledge, 1937.

__________. Empiricism, Semantics, and Ontology. Revue Internationale de Philosophie 4. Chicago: University of Chicago Press, 1956.

__________. Superação da metafísica pela análise lógica da linguagem. Cadernos de Filosofia Alemã v. 21; n. 2. São Paulo: EdUSP, 2016. 

NEGARESTANI, R. Intelligence and Spirit. New York: Urbanomic, 2018.

QUINE, W. O. De um ponto de vista lógico. São Paulo: Editora UNESP, 2011.

WITTGENSTEIN, L. Tractatus Logico-Philosophicus. São Paulo: Editora USP, 1968.

______________. Investigações Filosóficas. Coleção Os Pensadores, vol. LX. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999. 

WOLFENDALE, P. Object Oriented Philosophy: The Noumenon’s New Clothes. New York: Urbanomic, 2014.


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One response to “Carnap: Ontologia e Meta-ontologia”

  1. […] dias o Cássio escreveu sobre algo interessante na obra de Carnap, que não conheço. É que ao invés de pensar a […]

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